(Atualizado em 11 de março de 2024)
Por:
Allan de Oliveira.
contatoallandeoliveira@gmail.com
“Enquanto houver sofrimento, peste,
sempre haverá arte”.
(Antine)
Antônio Sobral Ribeiro conhecido como
Doris nasceu a 02 de outubro de 1980 (sendo que no seu RG está datado como
10/10/1980). É filho de Dona Enedina da Conceição Sobral e de Seu Argentino
Ribeiro Oliveira.
Cursou as primeiras letras numa casa de
alfabetização conhecida como Dona Carmem, situada na Avenida 7 de Setembro
(hoje Mamede Paes Mendonça). Estudou o primário na Escola de 1º Grau General
Valadão, o ginásio no Jackson de Figueiredo e o Ensino Médio no Atheneu
Sergipense e no Severino Uchôa.
Aos 11 anos escreveu seu primeiro poema
em admiração a uma vizinha chamada Glorinha.
Com 13 um tio lhe apresentou o livro
“MarÃlia de Dirceu” de Thomás Antônio Gonzaga do qual não lhe agradou.
Chegou a ler algumas obras de Júlio
Verne e depois a obra “Cândido, ou o Otimismo” de Voltaire, identificando-se, e
também se influenciado pelos poemas de Augusto dos Anjos, a literatura russa de
Dostoievski, Gorki, e a literatura do norte-americano Henry Miller, bem como a
literatura proletária de George Orwell.
O autor é um autodidata também
influenciado na literatura marginal (aquela literatura que não se enquadra em
estilos de época e que é produzida por excluÃdos da sociedade) e escreve contos
e poemas. Além disso, chegou a escrever em 1999 uma peça chamada “A Mesa”
(influenciada em “O desejo pego pelo rabo” de Pablo Picasso) que, infelizmente,
foi perdida. Em 2001, ajudou a escrever a peça teatral “Palco da Discursão” em
parceria de Allan de Oliveira (idealizador deste blog), além de ter escrito
letras de músicas para as duas bandas de rock and roll (El Diablo e
Antagônicos) das quais foi vocalista.
Em sua obra são notadas crÃticas
sociais e à s religiões, ateÃsmo, mostrando caracterÃsticas bukovisquianas
(tanto na forma de escrever quanto no estilo de vida).
O autor chegou a vender nas ruas de
Aracaju e em alguns municÃpios de Sergipe seus contos em formado de livreto,
dentre esses “A vida é um veneno necessário”, “Os Medrosos”, “A Nelson
Rodriguez”, entre outros. Mas só teve apenas uma publicação oficial pelo
Colégio Atheneu Sergipense em um concurso literário do qual ganhou o 4º lugar.
Com o passar dos anos, Doris passou a
adotar o heteronônimo “Antine”, mostrando também certa influência no escritor
português Fernando Pessoa.
Antônio Sobral foi também desenhista. Ele faleceu em sua casa localizada em Aracaju/SE no dia 26 de janeiro de 2019 de problemas do coração.
PARA MINHA IRMÃ ANTINE
Uma mulher de voz segura
Me asfixiona
E em aprisiona
Deixando-me molhada e pura.
Toda psiquiatria madura
Me posiciona
Como uma zona
De doenças sem cura.
Tenho personalidade escura
E tu me posiciona
Como uma persona
Sem libido, jankie, e imatura.
ELA E EU
Poesia não é canto de canário
É o grito do estômago sem essência
É a mão estendida perante a ciência
É um tiro no coração do otário.
Poesia não é ponto imaginário
É o choro do sertão sem clemência
O viciado que não tem mais paciência
E rouba o que lhe é necessário.
Poesia não é moda, é morte.
É toda aquela falta de sorte
Que em sua frente disse, sim.
Poesia é um enorme passaporte
Para a terra daquele que é forte.
Eis o que é para mim.
DEITADA NO QUARTO DE UM AMIGO ENQUANTO
ELE ESCREVE
Já vi gente comemorar
Um novo escravo emprego.
Já vi raspar a cabeça
Por uma ditadura escolar.
Já vi gente estourar os bolsos
Por melequentos que só berram.
Já vi corno feliz em minha frente
Sem saber que ontem mesmo chupei-a.
Mas, nunca vi em pleno gozo
Um cachaceiro amigo em minha frente.
Isento de lamúrias
Cuspindo luxúrias.
Tão explosivo
por dar seu último conto
seu último
conto.
(Antine)
OS MEDROSOS
A nostalgia dos lençóis desarrumados, o
cheiro conhecido e a inútil tentativa do novo, há tempos que são os silenciosos
conhecidos do jovem casal.
Maquinalmente ela deita sua cabeça num
conhecido peito e ele corre os dedos por entre os familiares coitos com a ideia
de que aquele era o melhor momento.
Sim, os monogâmicos e seus laços,
reflexo de uma sociedade reprimida por uma aparente educação que por sua vez é
a mais doce das mentiras.
As mentes nada questionavam, pois as
novidades eram covas.
Era tempo de piedade aos seus frescos
corpos que se estendiam tão bem e que sempre se algemavam no quarto dela. Jovem
cópia de uma “roqueirinha” qualquer: visual a mil, conhecimento vil.
- O que vamos fazer hoje? – Já no
chuveiro perguntou ela a ele que voando respondeu com descarga.
A inércia é o pior dos vÃcios.
Deixa-nos cegos, ocos, marionetados por seres incansáveis que se rejuvenescem
com nossa lenta morte diária.
- Hein! O que vamos fazer hoje?
- O quê? – Perguntou ele quando baixou
voo.
E ao refazer-lhe a pergunta, ele teve
como resposta o que já ansiava: Shopping (a melhor passarela para parecer
feliz).
O resto é resto.
Com medo deles próprio se deixam
encaminhar por outras mãos que levam as bandeiras da felicidade como quer o
figurino social.
Normas nos sentimentos. O que significa
isso?
Nunca reprima o que sente. Os danos das
perdas são prelúdios para novidades. “Perder” alguém é limitar-se a outros
limites. O amor deve existir de si para si. Querer ser amado é ter falta de
amor próprio, e falta de amor próprio é o alvo mais exposto para o cupido mais
certeiro.
A NELSON RODRIGUES
“O casamento já é indissolúvel na véspera”.
(Doris)
Como pontualidade é questão de
ansiedade, ele logo se via chupando um cigarro atrás do outro: “É engraçado. As
pessoas dizem que fumam para relaxar, se o que realmente acontece em minha
opinião, é que todo o corpo cai e eis o relaxamento”.
Avistou uns cabelos surgindo por trás
de uma árvore, mas não era o dela. O céu amarelado previa o crepúsculo como um
moribundo, e é só o que presta nessa merda de “Cajú”.
- Que horas tem? – perguntou ela a uma
transeunte que respondeu: 17:38h.
Novos relacionamentos sempre trazem
velhos hábitos, por isso, nunca se evolui com eles.
Um ansioso horizonte brincava com ele,
que se via esmagado por não está do outro lado da cidade enchendo a cara. Mas,
não. Ele não dá o troco, até devolve o dinheiro a mais no troco, por isso que
eu lhe chamo de “inglesinhodacabeçachata”.
As luzes dos postes se acenderam e ele
quis sair. Um estalo projetou-lhe na mente imagens sobre um novo curta que se
resumia no seguinte: A primeira tomada seria um relógio marcando 23:59h. Um zoom
abre devagar toda a cena na qual se via debaixo do braço de um homem, uma
mulher com a cara de choro. E assim que marca meia-noite, toda a tela se apaga
e só se escuta tapas e gritos da mulher. Ele ainda não tinha tÃtulo. Pensava no
tal “dia das mulheres”, mas, infelizmente, não lembrava a data.
Sorriu. Um sorriso semiconcluÃdo. É uma
das melhores sensações de um semi-artista. Fumou um “fino” e a angústia dobrou.
Virou uma “dose” e relaxou: “Cachaça é massa. É um diazepan misturado com
felicidade”.
Observou as beldades intocáveis de
Aracaju. Coisinhas ocas que se esticam por qualquer buzina.
Então surge ela. Uma Atenas nos seus
olhos. Longos cabelos cacheados que resistiam aos ventos marÃtimos, os quais
como reverência, pareciam dizer: “São tão lindos. Não somos dignos de tocá-los
em sua perfeição”.
Ombros fortes. Toda ela, forte. Na mais
intelectual expressão da palavra.
O seu cheiro, mesmo de longe,
enchia-lhe de alegria os pulmões oprimidos por essa tristeza aracajuana. E com
passos delicadamente firmes, chegou até ele, beijou sua testa, deu um abraço
semi-esperançoso e disse:
- Só vim aqui para dizer que vou a uma
festinha ali. Tá?
A alcoólatra Maysa veio-lhe à mente.
Nada disse. Apenas a olhou e deu-lhe um soco bem no meio do nariz e sentiu um
imenso prazer em vê seu sangue lhe contornar a boca, seguindo do queixo,
enquanto ela se levanta do chão para, enfim, dá-se carinhos necessários pelo
resto da noite!
Antine, Antônio, Doris...Tétrico, cético, denso...um lapso na existência como todos nós a nausear bêbadas palavras, a agonia vindoura que nos toma no instante. Constante cruel, rude, impiedosa, implacável. Uma mortalha tecida pela caprichosa natureza instável que finda nos corpos, mas se perpetua no que vem, a única certeza negra a descansar a terra que a todos espera. Eis-me aqui camaradas, eis-me aqui camarada. Nada disso faz sentido, e tudo faz, como diz Camus. Meus companheiros de boemia e de garrafas (rsrsrs), tantos mendigos, tantos trapos, tantas belezas e tantos demônios a noite (hahaha).Demônios as vezes lacônicos, mudos, imersos no silêncio. Muito bom revê-lo nas palavras, nos sussurros e nos gritos. Sigamos até que o fim nos chame a todos, mas antes sem deixar ao menos um pequeno estrago nas consciências, a tudo o que se maqueia. Eis-me aqui camaradas ! Eis-me aqui Tenório, eis-me aqui Dóris. Como um fantasma! Muito bom revê-los!!!
ResponderExcluirBelas palavras, meu amigo Júnior. Seja bem vindo a esse modesto blog.
ExcluirEncontrava com Doris na catedral, Rua da Cultura, pelas ruas, calouradas e eventos da UFS. Ele sempre com bebida na mão, refletindo e sempre explanando a vida sergipana como ela é. Poucas vezes eu tive a sorte de trocar ideia com ele. Mas as vezes em que conversamos, foram épicas. Para os mais próximos, um amigo intelectual; para a vida noturna, um adepto e para a sociedade sergipana em si, um ilustre desconhecido.
ResponderExcluirSim. Ele foi bem gente fica, interado em cultura, e criticava a sociedade em si por ser caracterÃstica de um autor marginal.
ExcluirExatamente isso, Murilo.
ResponderExcluirPassados quase 4 anos, incluindo dois últimos de pandemia, por essa postagem numa rede social fiquei sabendo do falecimento dessa figura tão presente na vida cultural do centro de Aracaju. Fica na memória a imagem dum cara que deve ter deixado boas lembranças pros amigos.
ResponderExcluirSem dúvida.
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