Atualizado em 12/07/21
Por: Allan
de Oliveira.
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— Onde fica essa lixeira, Joaquim? – perguntou
o passageiro ao motorista.
— Já tamo chegano – respondeu o motorista.
Eram dois funcionários de um supermercado. Eles
eram conduzidos por um caminhão rumo a um terreno baldio de uma periferia da
cidade para descarregar o lixo da empresa naquelas grandes caçambas que serviam
como lixeiro.
Passados alguns minutos, o veículo chegou ao local
e os dois trabalhadores começaram o serviço. Ao abrirem a carroceria, o
motorista subiu para empurrar as caixas, enquanto o outro iria descarregar na
caçamba.
O ambiente causava um sentimento de melancolia.
Nele havia uma vala fétida onde, provavelmente, era a morada de insetos
asquerosos, com um matagal do outro lado da rua que servia como ponto para uso
de entorpecentes. Tratava-se, na verdade, de local esquecido pela administração
pública do qual a alta sociedade pouco se importava.
— O que tem nessas caixa, Joaquim?
— Alimentos fora da validade – respondeu
Joaquim dando uma pausa para depois concluir – Esses alimento já tem 6 a 8 mês
que tão vencido. É biscoito, cereal pra fazer mingau, leite em pó, e mais
coisa.
— Cara! – espantou-se o outro.
Terminado o serviço do descarregamento, Joaquim
desceu para ajudar o parceiro a jogar as caixas na caçamba.
— Vamo fazer o seguinte – sugeriu Joaquim –
Agente tira as etiqueta dos preço prá não complicá nem a empresa, nem o patrão.
— Certo – concordou o outro.
Após retirarem as etiquetas de preços das caixas
dos produtos. Eles foram jogando as caixas na caçamba de lixo e a conversavam
sobre os problemas da empresa relacionados aos “puxa-sacos”, aos seus
relacionamentos conjugais sem futuro, e a apreciarem as jovens vestidas com
roupas curtas que passavam no local e se insinuavam para eles. Um deles as
comia com os olhos:
— Gostosa!
— Vamos trabalhar, mêrmão! Agente ainda tem
que almoçá! – repreendeu Joaquim.
Realmente Joaquim estava certo. Afinal de contas, a
barriga já estava roncando e o sol, de matar.
Passados poucos minutos, sem dirigirem uma palavra
ao outro; e sem ao menos esperarem, surgiram algumas pessoas de dentro da
caçamba de lixo. Umas duas ou três. Um detalhe que os dois não tinham notado
quando chegaram.
Essas pessoas eram catadores que envergonhados se
revelaram quando ouviram a conversa daqueles dois trabalhadores.
— Cara! Que porra é isso?
— É os catadores, véio! – respondeu Joaquim.
— Mas assim dessa forma?
— Sabe de nada, inocente!
Quase para concluir o serviço, um garoto de
aproximadamente 10 anos, surgira de dentro do latão.
— Oxe! Que é que é isso, meu irmão?
Joaquim fez cara de riso por causa do espanto do
colega de trabalho por já está acostumado com aquelas cenas, dizendo em
seguida:
— Acabamo! Vamo cair fora!
Quando os dois trabalhadores estavam abrindo as
portas do caminhão para adentrarem e retornar ao supermercado, bater o ponto, e
almoçarem, viram ainda mais três outros garotos com a mesma idade escondidos na
caçamba, recolhendo aqueles restos de alimentos sem validade. Mas, quando fora
dada a partida no motor do veículo e esse seguiu o seu rumo, surgiram mais
pessoas (mais crianças, adultos, e idosos) por todo o terreno baldio que foram
entrando na caçamba de lixo.
Apesar das pessoas demonstrarem grande
contentamento no olhar, elas se assemelhavam a zumbis, recolhendo aquelas
migalhas estragadas para saciar a fome. Resistindo bravamente como guerreiros a
um sistema sanguessuga que as forçou a viver naquela condição: marginalizadas e
afundadas na miséria.
Por: Allan de Oliveira.
02 de dezembro de 2015.
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¹ Nota: o
presente conto faz parte do livro “Histórias aceitas por ninguém”, de Allan
de Oliveira que você, leitor, poderá adquirir em alguns dos links logo
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