GENIVALDO FILHO

(Genivaldo Filho, poeta brasileiro)

 

Por: Allan de Oliveira.

contatoallandeoliveira@gmail.com

 

Genivaldo Filho é natural de Aracaju/SE e nasceu a 04 de março de 1989, sendo filho de Genivaldo Gonçalves e Kátia Silvina. Estudou as primeiras letras na Escola Estadual Profa. Maria Hermínia Caldas localizada em Nossa Senhora do Socorro, fazendo o Ensino Fundamental II na Escola Estadual 24 de Outubro, e o Ensino Médio no Colégio Estadual Governador Valadares. Graduou-se em Pedagogia pela Faculdade São Luís de França em 2010 e fez uma pós-graduação em Didática e Metodologia do Ensino Superior na mesma instituição. 

Seu interesse por poesia ocorreu na 7ª série na Escola Estadual 24 de Outubro quando uma professora passou em sala de aula uma atividade para ser produzido um poema, o que para um adolescente a ideia não foi bem aceita. Porém, ao perceber que escrever poesia é mostrar os sentimentos interiores, de lá para cá, o autor nunca mais deixou de escrever. 

É influenciado por Charles Bukowki, Jacques Derrida, Mário Quintana, Martin Heidegger, e Carlos Drummond de Andrade. Mas, de acordo com as palavras do próprio autor: “- É meio complicado essa coisa de influência, pois muitas vezes comete-se o equívoco de condensar o poeta à influência ou ao conjunto de influências que o antecedem, numa espécie de ligação compulsória que categoriza o poeta como adepto desse ou daquele grupo de poetas que o influenciaram. O que quero ilustrar é que cada porta tenta materializar a realidade empírica que se lhe apresenta, cada poeta tenta transcender as substâncias que consegue captar e essa forma de expressão é tão singular que parece personificar o autor”. 

Ao ser feita uma análise modesta, notou-se certa quebra de padrão formal em seus poemas, mostrando uma literatura pós-moderna ou contemporânea, corrosiva, crua, e seca, com alguns tons líricos. Sendo que foi notada certa semelhança em Augusto dos Anjos como podemos ver no verso abaixo:

“Pútrida e Fétida é a boca

Horrenda e assustadora

Boca cheia de cracas

Adornada por um laço circular de pendão pentagonal

escorrendo peito abaixo

Trajada de preto e branco”. 

Além disso, percebeu-se também um pouco de regionalismo, sergipanidade, e defesa das raízes indígenas do Brasil:

“Eu, herdeiro das águas de Serigy¹

Empunhei minha espada de seis lâminas

O som era meu, cada nota numa marcha rítmica para

Anunciar minha Avalanche”. 

Já em seu poema “Brasil”, nota-se denúncias das mazelas sociais, dando destaque para a Invasão Portuguesa de 1500 (da qual chamam de “Descobrimento do Brasil”). Além de serem denunciados os maus tratos e genocídio dos povos originários (os indígenas), a imposição da religião cristã ao negro escravo e aos próprios indígenas, da qual o poeta faz um pequeno histórico do país, denunciando as duras leis do Regime Militar que beiram ao Integralismo (a versão do Fascismo Brasileiro), bem como outras denúncias, e defendendo o povo oprimido e a cultura afro e indígena. 

O poeta também retrata o cotidiano de pessoas que visam a estética de um corpo bonito, denunciado a imoralidade gratuita como se vê no dia-a-dia e nos meios de comunicação, usando certo sarcasmo em sua descrição, como é visto no poema “Por toda parte”. 

Além de todas essas influências citada acima, percebemos um romantismo saudosista ao serem retratadas as saudades do passado mostradas no poema “Pretérito mais que perfeito”, e lirismo no poema “Teu nome”. Lirismo esse que é comentado no prólogo pelo próprio autor: “A ideia do Amor sempre me foi fascinante, muitos dos poemas que escrevo falam do Amor, creio que a única coisa real que temos na vida é o Amor, pois só ele é capaz de nos motivar ao alcance das maiores conquistas e só a ausência dele pode nos levar aos mais cruéis algozes e aos maiores infortúnios que se pode pensar”. 

Atualmente Genivaldo Filho reside em Sergipe e trabalha como professor na rede estadual. 

 

A BOCA

 

Fétida é a boca

Boca cheia de dentes e cracas

Horrenda e assustadora boca

Trajada de preto e branco

Adornada por um laço circular de pendão pentagonal

escorrendo peito abaixo.

 

A podridão está no corpo inteiro

Do ouro à prata

Do papel à caneta

Endo e Exotérmica

Arruinando tudo

Como um câncer em metástase

Arraigada em cada célula

Orbitando em cada molécula

Transitando em cada átomo.

 

Intrincada no âmago da alma

Melhor dizendo das almas

Mas este mérito é da responsabilidade do Messias

 

Indubitavelmente podridão

Repito

Há podridão

 

Transitando tal qual uma lagarta

Mas sem a menor pretensão de tornar-se borboleta

Oculta em uma série de outras coisas ocultas

Legitimada em outra infinidade de coisas maquiladas

 

O horror e a vergonha de seu fedor são latentes

Pode-se sentir a quilômetros

Afinal

O carnaval vem e vai todos os anos

Feriado

Panis et circenses

Numa tentativa de prolongar a dormência carnavalesca

para além das eras

Enquanto suas faces cintilam como miríade de

vagalumes

 

Pútrida e Fétida é a boca

Horrenda e assustadora

Boca cheia de cracas

Adornada por um laço circular de pendão pentagonal

escorrendo peito abaixo

Trajada de preto e branco. 

 

BRASIL

 

Ao longo

A névoa do mar secreta o Leviatã

São três as pontas do Tridente

Três as Capitais

Três as Caravelas

 

Ao longe

A névoa densa é soberana

Tal qual o mar da nossa costa

 

Num instante

Ínfimo instante

Séculos e Séculos

Séculos da mais pura Civilização

 

Três Caravelas

Homens

Mulheres

Crianças

 

Três Caravelas

Índios

Índias

Curumins

 

Civilização

Barbárie

Civilização

 

Ao longe se tornou próximo

Da proximidade à Civilização

A que preço?

Sangue

Genocídio

Triste e tortuoso pesar

Melhor seria um fado

 

Trabalho

Dignidade

Escravidão

 

O que se há de fazer

Se Negra é a Noite

Negro é o Dia

E Branca é Fé

 

Império

República

Maquiavel nos alertou

 

Homens

Mulheres

Crianças

Índios

Índias

Curumins

Crioulos

Nobres

Pobres

Brasileiros

 

Ordem e Progresso

Bendito é o verde-louro dessa flâmula

Paz no futuro

Glória no passado

 

Quem nos dera a Coragem

Uma Courage de La Veritè

Algo que nos permite falar

Gritar a Pahresia

 

Cafezais e Pastos

Pastos e Cafezais

Cinquenta em Penta

Golpe

Cruzado de Direita

Cruzado de Esquerda

Nocaute

Melhor dizendo

Knockout

 

(Livro “Sem maiores pretensões”, de Genivaldo Filho)

 

AI-1 ∑ AI-5

O povo castrado

Os punhos cerrados

Silêncio

Solidão conjunta

Patriotismo indubitável

À massa que grita Olé!

À massa que jaz muda

E assente no mais devoto e casto silêncio

As primazias da Democracia

 

Crise

Expansão econômica

Flâmula Vermelha forjada a ferro e fogo

Agora desbotada e carcomida pela selvagem ferrugem

E cá nos Trópicos

Eis a tão sonhada Democracia

Aliás

Nova Democracia

Ou quem sabe

Redemocratização

Caprichos político partidários

 

Utopia real na Alvorada

Apitos, faixas, cartazes

O Carnaval político dos caras-pintadas

 

Quanta bobagem

Cícero, Platão e Maquiavel

República

 

Bug do Milênio

Mil e uma novidades da Pós-Modernidade

Nunca na História desse país...

 

Agora

Finalmente agora

Vê-se ao longe o mar

Nele há a mesma névoa de outrora

Agora livre das Caravelas

 

Três Caravelas

 

E o que se quer é uma Refazenda

Quiçá uma Anacronia newtoniana

Expurgar os fantasmas do passado

Superar os traumas da História

Conquistar os “Nuncas”

Extirpar o partidarismo da Democracia

Cessar o fogo inquisidor

Fazer dos cafezais um Éden repleto de macieiras

E dos postos uma Canaã

De Norte a Sul

De Leste a Oeste

Depor os imperadores

Tomar os “castelos”

Libertar o povo

Restituir-nos os braços, as pernas e as ideias

 

E que pelo bem da Nação

Vão embora!

Para que nossos dias e noites sejam novamente em

Tupi-Guarani

Para que os Orixás nos perdoem por derramar seu

sangue

 

Que o Arco e a Flecha nos honrem

E as três Caravelas que se vê ao longe

Que mudem de caminho caso queiram nos descobrir

Que mudem de caminho caso queiram civilizar

Que mudem de caminho caso queiram nos gerar todo o

pretérito que conjugamos até aqui

Caso pretendam nos chamar...

Brasil! 

 

POR TODA PARTE

 

Carne

Carne...

Carne!

 

Por toda parte

Propagandas

Peitos, Bundas, Bíceps, Tríceps, Coxas...

“Gente Sarada e Beleza Cult”

 “Fitness Plus Size”

 

Por toda parte

 

No supermercado

Nas valas

Nas casas

Nos jornais

Estatísticas...

Felicidade ao alcance do vai e vem do cartão de crédito

 

Por toda parte

 

“Outdoors”

A morte estampada em cada sorriso

“Não perca essa oportunidade”

“Um empreendimento de sucesso”

“Seja um vencedor”

E a fumaça cancerosa cumprimenta os pulmões

 

Por toda parte

 

Uma miríade de rostos disformes

Suas almas exauridas de qualquer força que outrora

esboçavam

As esperanças ressequidas e débeis

Imersas na mais complexa obsolescência

Desenganados da vida

 

Por toda parte

 

O sol não nasce para todos

E a vida é uma dádiva para poucos

Alguns apenas sobrevivem

Sequer existem

 

PRETÉRITO MAIS QUE PERFEITO

 

Das tardes de inverno

Quero o afago do vento

Que apesar de gélido

Mostra-se como o carinho mais singelo

 

Na mente cansada e envelhecida

Talvez pelas ideias agora obsoletas

Talvez pela tenra senilidade que acomete o homem

Há o solitário e imberbe desejo da juventude

 

E no frio cortante como um gole de cachaça

Aquecer a ossatura ou a penumbra que dela restou

Ousar esticar as pernas e os braços contra a Lei da

Gravidade

 

Daí então

Regressar lenta e despojadamente à plenitude da

consciência

Abrir os olhos e projetar a juventude de que gozara

nos pretéritos mais que perfeitos. 

______________________

¹ Serigy: cacique das tribos tupinambás que rondou terras aracajuanas no início da colonização portuguesa, e famoso por seus atos de canibalismo. (Nota do organizador do blog) 


REFERÊNCIAS: 

FILHO, Genivaldo. Sem maiores pretensões. Aracaju. Brasil Casual, 2018.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem

Formulário de contato